sábado, 12 de maio de 2012

Até onde, até quando - Jânio de Freitas

Os episódios de corrupção no Brasil emendam-se uns nos outros, em uma inflação de imoralidade
Até os pequenos intervalos estão extintos. Os episódios de corrupção emendam-se uns nos outros, em uma inflação de imoralidade com a qual o país convive, e à qual se adapta, como peça natural dos seus costumes, tal como fez com as décadas de inflação monetária. Havia, então, o sentimento abafado de que se vivia uma situação a caminho do seu limite. E agora: até onde e até quando seguirá a degradação que se espraiou pelo país todo? A tendência histórica é alguma forma de estouro.
A dimensão de escândalo está reservada aos episódios gerados por Brasília. Em parte, por motivos políticos; em parte, por estar cada vez mais reduzida, nesta fase dos meios de comunicação, a sua função informativa. Mas, com variações de grau decorrentes, sobretudo, das circunstâncias locais, os episódios da degradação multiplicam-se pelo país todo, em escândalos proporcionais ao seu meio.
Os escândalos, porém, vão ficando menos escandalosos. O caso que envolve Carlinhos Cachoeira com o senador Demóstenes Torres e um montante ainda impreciso de congressistas, e portanto com o Congresso; mais governantes de Goiás e do próprio Distrito Federal, empresas, empresários e bilhões de dinheiro público, com tudo isso só tem provocado piadinhas. Vá lá, e algum espanto, creditável ao senador Demóstenes. Indignação, nenhuma.
O que aconteceu no primeiro ano de mandato de Dilma Rousseff dispensaria qualquer outro exemplo para caracterizar a situação. Seis ministros, representantes de partidos componentes do Congresso Nacional, tiveram que ser destituídos já nos primeiros meses do governo, a bem da moralidade administrativa. Foram-se, e pronto. Tudo ficou como se não significasse coisa alguma. E não merecesse nem um tempinho de reflexão ou debate, sobre suas causas e sentidos, por uns quantos doutores, cientistas, professores, intelectuais.
"É a impunidade, eles sabem que ficarão impunes, é preciso acabar com a impunidade" -aí está a explicação geral. Automática. Definitiva. E vazia. Não, a impunidade não é causa. É parte suplementar da degradação, associada à corrupção mesma -a qual, aliás, veio antes da impunidade, que lhe deu seguimento, uma extensão com a mesma origem, a mesma função e o mesmo propósito.
Até onde irá o colar de episódios escabrosos que se estende e ramifica, em uma ocupação sem resistências? Até quando o dinheiro público será saqueado pela pirataria das obras, das compras, dos contratos de serviço? Em vez de servir às necessidades da população que o proporcionou aos cofres oficiais.
Até onde, até quando.

(Fonte: Jânio de Freitas - Folha de S. Paulo - 24/4/12)

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